O uso da máscara: seria cômico, se não fosse trágico

O uso da máscara. Seria cômico, se não fosse trágico

A máscara está presente na vida do ser humano há mais tempo do que imaginamos - e pode ser que se torne cada vez mais necessária.

Não me lembro quando foi a primeira vez que vi uma máscara. Cresci em casas sempre muito decoradas pela minha mãe e, desde pequeno, recordo de haver máscaras em algum ambiente. Havia uma máscara africana, de madeira, com cores neutras e sóbrias. Lembro também de umas de pedra, meramente decorativas, esculpidas por algum artesão interiorano. A que eu mais gostava, no entanto, era uma dita veneziana, de metal, trazida por uma tia. 

Quando surgiu a primeira máscara?

Assim como é impossível saber como a primeira máscara apareceu na minha vida, é também inconcebível determinar quando surgiu a primeira máscara da humanidade – até porque, provavelmente, foi feita a partir de algum material que já se desintegrou. O que eu sei é que as mais antigas já encontradas têm aproximadamente nove mil anos e são de pedra. 

Objetos de representação cultural, as máscaras são uma arte funcional. Foram – e ainda são – utilizadas para proteção, ornamentos, cerimoniais, rituais e, claro, para o teatro. Quem não se lembra das máscaras gregas de tragicomédias?

Além disso, é possível ver em tumbas persas pessoas com rostos cobertos com máscaras esculpidas. Na literatura, “As viagens de Marco Polo”, já traz o uso delas por servos do imperador chinês da dinastia Yuan, no século 13. 

Na Europa medieval, eram utilizadas para evitar miasmas provenientes de enfermos. Da Vinci já propôs utilizá-las como método para evitar inalação de substâncias tóxicas, como os bombeiros orientam para escapar de incêndios. 

O uso de máscara na medicina

As máscaras tiveram outro significado em minha vida quando iniciei o curso de medicina. Antes, restritas a ambientes hospitalares e quiçá em outros lugares atendimento à saúde, utilizava-as quando fazia algum procedimento cirúrgico – para evitar contaminações. 

Na história da medicina, as máscaras foram utilizadas ao longo dos séculos em diversas nações, mas só tiveram seu uso bem estabelecido quando por volta de 1880. Foi nessa época que começaram a perceber a importância das técnicas de assepsia (entenda-se: evitar que o ferimento se contamine). Nessa época, um bacteriologista chamado Carl Flügge demonstrou que a respiração carregava bactérias e, a partir de 1897, médicos europeus instituíram as máscaras em ambientes operatórios para evitar que a respiração dos cirurgiões contaminasse a ferida operatória.

Alguns anos depois, com a assolação da gripe espanhola, o mundo percebeu que, além de não deixar o micro-organismo sair e contaminar o ambiente, a máscara impedia, de certa forma, que ele entrasse no corpo e causasse uma doença. Algumas cidades, como São Francisco, nos Estados Unidos, foram modelos para demonstrar que as máscaras eram uma arma contra a pandemia. Nesta mesma época, os japoneses começaram a usar máscaras. Certamente, você já viu algum japonês utilizando uma máscara em um dia normal e em um mundo normal – e achou aquilo muito estranho! Pois eles têm essa cultura há um século. O hábito foi incentivado nos anos dois mil, com o surgimento de novas gripes no oriente.

Atualmente, neste mundo não mais tão normal, enfrentamos a COVID19. Mais uma pandemia que nos mostrou a ineficiência da medicina em combater alguns vírus e a fragilidade dos sistemas públicos e privados do mundo todo. Não há remédio contra esse tipo de coronavírus e, de novo, só nos resta adotar a máscara. Mas teremos que usá-la ad aeternum? 

Até quando usaremos máscara?

A exemplo dos japoneses, deveríamos pensar seriamente nessa possibilidade. Já temos inclusive trabalhos em curso para verificar se a máscara pode evitar alguns tipos de câncer, uma vez que substâncias que inalamos são causas de câncer de pulmão e mesmo leucemia.  

Alguns países já suspenderam o uso de máscaras, como Israel (que possui mais de 70% da população vacinada) e Butão (que possui mais de 90% da população vacinada). Além disso, o Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos disse em abril que pessoas vacinadas poderiam se livrar das máscaras, desde que não estivessem em ambiente de risco, como serviços de saúde e transportes públicos. 

Ainda não há regra sobre quem pode, ou não, continuar a utilizar a máscara ou qual a porcentagem de população vacinada seria segura para isso. Além disso, outros fatores devem ser considerados: as vacinas são diferentes e possuem taxas de imunização diferentes; novas variantes podem surgir; e tomar vacina não é uma certeza absoluta de não adquirir a COVID19. 

Por último, para tomar uma decisão dessa, é preciso entender a maturidade da população. Por exemplo, no Brasil, será que algum “não vacinado” não se misturaria aos “sem máscaras vacinados” apenas para gozar da sensação de libertinagem – ou por não entender a importância do uso da máscara? 

Um dever cívico

Os contrários às máscaras existiram na Gripe Espanhola em 1918, vide a Liga anti-máscara. Existem hoje com a COVID19 e existirão na próxima pandemia. O que precisamos fazer é mostrar que eles estão errados e cessar a inflamação sobre o assunto.

Usar máscara não é uma obrigação no seu sentido de obrigar alguém a algo, mas sim uma necessidade moral, um dever cívico. Desobrigar o seu uso – antes do tempo – só demonstra a ineficiência de um governo e a ignorância de quem o segue.

Um beijo,
Dr. Rodrigo

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